quinta-feira, março 24, 2005

Que futuro?



Em semana de Dia Mundial da Água, resolvi postar uma carta à qual acedi durante uma visita ao futuro que fiz a bordo da máquina do tempo de um cientista amigo... lol
A carta data de 2070!... É para ler... e pensar!!
É caso para dizer: ainda vamos a tempo!! Este texto será "apenas" ficção??...


"Acabo de completar 50 anos, mas a minha aparência é de alguém com 85. Tenho sérios problemas renais porque bebo muito pouca água. Creio que me resta pouco tempo. Hoje sou uma das pessoas mais idosas nesta sociedade.

Recordo quando tinha 5 anos. Tudo era muito diferente. Havia muitas árvores nos parques, as casas tinham bonitos jardins e eu podia disfrutar de um banho de chuveiro com cerca de uma hora. Agora usamos toalhas de azeite mineral para limpar a pele.

Antes, todas as mulheres mostravam as suas formosas cabeleiras. Agora, devemos rapar a cabeça para a manter limpa sem água.

Antes, o meu pai lavava o carro com a água que saía de uma mangueira. Hoje, os meninos não acreditam que a água se utilizava dessa forma.

Recordo que havia muitos anuncios que diziam CUIDA DA ÁGUA, só que ninguém lhes ligava - pensávamos que a água jamais podia acabar. Agora, todos os rios, barragens, lagoas e mantos aquíferos estão irreversivelmente contaminados ou esgotados.

Antes, a quantidade de água indicada como ideal para beber eram oito copos por dia, por pessoa adulta. Hoje só posso beber meio copo.

A roupa é descartável, o que aumenta grandemente a quantidade de lixo e tivémos que voltar a usar os poços sépticos (fossas) como no século passado já que as redes de esgotos não se usam por falta de àgua.

A aparência da população é horrorosa: corpos desfalecidos, enrugados pela desidratação, cheios de chagas na pele provocadas pelos raios ultravioletas que já não tem a capa de ozono que os filtrava na atmosfera. Imensos desertos constituem a paisagem que nos rodeia por todos os lados.

As infecções gastrointestinais, as enfermidades da pele e das vias urinárias são as principais causas de morte.

A industria está paralizada e o desemprego é dramático. As fábricas dessalinizadoras são a principal fonte de emprego e pagam-nos em agua potável o salário. Os assaltos por um bidão de agua são comuns nas ruas desertas. A comida é 80% sintética.

Pela ressequidade da pele, uma jovem de 20 anos está como se tivesse 40. Os cientistas investigam, mas não parece haver solução possivel. Não se pode fabricar agua, o oxigénio também está degradado por falta de arvores e isso ajuda a diminuir o coeficiente intelectual das novas gerações.

Alterou-se também a morfologia dos espermatozoides de muitos individuos e como consequência há muitos meninos com insuficiências, mutações e deformações.

O governo cobra-nos pelo ar que respiramos (137 m3 por dia por habitante adulto). As pessoas que não podem pagar são retiradas das "zonas ventiladas". Estas estão dotadas de gigantescos pulmões mecanicos que funcionam a energia solar. Embora não sendo de boa qualidade, pode-se respirar.

A idade média é de 35 anos. Em alguns países existem manchas de vegetação, normalmente perto de um rio, que é fortemente vigiado pelo exercito. A água tornou-se num tesouro muito cobiçado - mais do que o ouro ou os diamantes.

Aqui não há arvores, porque quase nunca chove e quando se regista precipitação, é de chuva ácida. As estações do ano tem sido severamente alteradas pelos testes atómicos.

Advertiam-nos que deviamos cuidar do meio ambiente e ninguém fez caso. Quando a minha filha me pede que lhe fale de quando era jovem descrevo o bonito que eram os bosques, falo-lhe da chuva, das flores, do agradável que era tomar banho e poder pescar nos rios e barragens, beber toda a água que quisesse, o saudável que era... ela pergunta-me: "Papá! Porque se acabou a agua?" Então, sinto um nó na garganta, não deixo de me sentir culpado, porque pertenço à geração que foi destruindo o meio ambiente ou simplesmente não levámos em conta tantos avisos.

Agora os nossos filhos pagam um preço alto e sinceramente creio que a vida na terra já não será possivel dentro de muito pouco tempo porque a destruição do meio ambiente chegou a um ponto irreversivel.

Como gostaria voltar atrás e fazer com que toda a humanidade compreendesse isto, quando ainda podiamos fazer algo para salvar ao nosso planeta terra!"

In revista biográfica "Crónicas de los Tiempos" de Abril de 2002

3 comentários:

Crepúsculo Maria da Graça Oliveira Gomes disse...

Querida Keia, fiquei sem perceber bem o teu post! tu tens problemas de saude? Agradeço que me respondas.
Um beijinho e boa`Páscoa

Raquel Reis disse...

adryka: n linda, n tenho nehum problema d saúde... a carta do post xegou-m p mail... data de 2070... lol é 1 espécie de "previsão" dakilo q pode ser a consequencia do nosso pouco (ou nenhum) cuidado na poupança de um recurso natural e tão vital km é a água... foi 1 alerta k resolvi lançar no blog... axei o texto forte... tvz demasiado ficcionado, tvz n...

*** boa pascoa pa ti tb! :)

Anónimo disse...

Lendo a crônica "Carta Escrita no Ano 2070" me surpreendi, pois tenho um texto escrito no início daquele ano, sob o mesmo tema e no mesmo estilo futurista, intitulado "Saudades do Apocalipse, que deu origem ao meu primeiro livro de contos, com o mesmo título.
Meu texto foi inscrito num concurso literário instituído pela FESP-RJ. O resultado deveria sair exatamente em abril de 2002, no entanto só saiu no ano seguinte. Meu texto ficou pra trás. Fui contemplado com mensão honrosa na categoria "crônica", com outro texto: "Bush, Você não Sabia, Nego?".
Veja o meu texto anexo e tire suas conclusões.

Fernando Soares Campos
PS: depois que vi que "Saudades do Apocalipse" não foi laureado no concurso da FESP-RJ , eu o inscrevi no Concurso Guimarães Rosa.

Saudades do Apocalipse


Fernando Soares Campos


243ª ZCOSGTA.
15 de outubro de 2053.

Como cheguei aos 74 anos de idade, não sei; sei apenas que aqui cheguei. Nasci a 16 de dezembro de 1978, logo completarei 75. Na virada do milênio, eu concluía o curso de Engenharia Florestal, uma teimosia vocacional, ou uma esperança infundada. Infundada sim, pois tudo indicava que num futuro bem próximo tal profissão seria declarada obsoleta. Sabia-se que muito em breve as nossas florestas seriam transformadas nos imensos desertos em que realmente as transformaram. E ninguém precisava de bola de cristal para prever tal desfecho. Antes da desertificação, o Brasil foi loteado em áreas semelhantes às capitanias hereditárias do início da primeira colonização, e os lotes serviram para liquidação das dívidas contraídas junto aos organismos financeiros internacionais. No final do segundo milênio, nova ordem econômico-financeira do mundo globalizado levou os chamados países do Terceiro Mundo à bancarrota e, na segunda década do século XXI, transformou-os em simples possessões; domínios à moda antiga, agora sob a denominação de ZCOSGTA’s — Zona sob Controle da Organização Supranacional para Gerenciamento dos Territórios Alinhados —, ou seja: as zonas sob controle são os territórios alinhados gerenciados pela OSGTA, a superorganização que os administra. Esta 243ª ZCOSGTA corresponde ao antigo Estado do Rio de Janeiro. São Paulo foi dividido em duas zonas: a 238ª (norte) e a 239ª (sul). Todo o Brasil (exceto a Região Amazônica, pois esta área já havia sido ocupada por um consórcio internacional anos antes) foi dividido em 45 ZCOSGTA’s. No início, aquilo era apenas o que chamavam de imperialismo suave, o soft imperialism, que encontrava defensores mesmo entre nós. Defensores?! Não, mais tarde (tarde demais) os reconhecemos pelo que realmente são: entreguistas. Depois veio essa degradante condição de tutela imperialista nos moldes antigos. Tão ou mais violenta que as ocupações nazistas durante a Segunda Guerra Mundial (raros são os registros que restam sobre esta fase da História). A Argentina foi um dos primeiros países a submeter-se ao controle da OSGTA, que à época ainda atuava sob os disfarces de FMI, Bird e de outras instituições financeiras internacionais.

22 de novembro de 2053.

De onde vem essa chuva oleosa que cai incessantemente? Quais as causas disso? Ainda não estão claramente definidos os motivos que a provocam. Há cerca de cinco décadas, no final do século XX, a cinematografia hollywoodiana, baseando-se nas experiências vividas em Hiroxima e Nagasaki, explorou esse cenário em produções futuristas. Atribuíam-na às conseqüências de um cataclismo atômico. No entanto, apesar de não se haver efetivado o terceiro grande conflito mundial, a hecatombe nuclear definitiva, aqui estamos debaixo desse gosmento chorume, antes só visto nos aterros sanitários. Nas ruas, as pessoas atingidas pelas primeiras precipitações desse viscoso líquido escuro acreditavam que estavam sendo alvo de uma estúpida brincadeira, achavam que alguém lhes atirava óleo queimado do alto dos edifícios. Tal equívoco provocou muitas discussões, brigas e até agressões seguidas de assassinato. Mas logo fomos informados sobre esse obscuro fenômeno. Chove sem parar. Se é que podemos chamar esse corrimento atmosférico de chuva. É como se o céu se encarregasse de permanentemente nos lembrar as agressões ambientais que cometemos nos últimos cem anos: imprudentes desmatamentos, excessiva poluição atmosférica, irresponsáveis represamentos e desvios de cursos fluviais, agressivos testes com ogivas nucleares e as mais criminosas agressões ambientais. Não, não cessa nunca. Ocorrem apenas mudanças no índice pluviométrico e na temperatura do lodo austral — denominação que alguns cientistas dão a esse óleo pluvial, por acreditarem que o fenômeno tenha origem no espaço aéreo perpendicular ao imaginário eixo polar sul, onde supostamente o globo terrestre processaria a poluição geral do Planeta, centrifugando os poluentes e redistribuindo-os sob a forma de gases concentrados, os quais se condensam e se precipitam dessa maneira chorumenta. É uma das muitas teorias sobre essa chuva mefítica (o mau cheiro lembra a catinga que se exalava dos canais que margeavam a extinta Ilha do Fundão), a de menor aceitação nos meios acadêmicos; porém a mais difundida entre a população, que hoje é extremamente mal informada (todas as notícias e informações gerais nos chegam via agência oficial da OSGTA, sob o crivo do Departamento de Censura). O que se conhecia como estações climáticas agora são períodos marcados pela intensidade das precipitações de chorume e sua temperatura. E não mais ocorrem em fases definidas. Outono, inverno, primavera e verão agora são condições temporais momentâneas, com início e duração até previsíveis pelos observatórios meteorológicos; todavia sem a verificação das fases estabelecidas pelos solstícios e equinócios como antigamente. Portanto, depois de um breve outono de duas semanas, poderemos retornar a um rigoroso verão, com temperaturas elevadíssimas e chorume abundante, durante toda a semana ou mesmo todo o mês seguinte. Sei que teremos um Natal hibernal, apesar de estarmos passando por um período de verão com a temperatura atingindo os 47 graus, porque ontem tomei conhecimento das previsões do infalível Departamento de Meteorologia: “Nas três próximas quinzenas a temperatura do chorume tende a ficar em torno dos 15 graus negativos” — se essa coisa congelasse, teríamos neve negra no Natal.

16 de dezembro de 2053.

Aniversario hoje. Completei os 75. Não haverá comemoração. Há muito tempo não se festejam aniversários. Não há motivos que justifiquem comemorações. Poucos, entre os que vivem (sobrevivem) aqui na Crosta, chegam a esta idade. Sabe-se que os milionários que moram nos SiJO’s, os Sideral Joint Ownerships, já ultrapassam em muito os 100 anos de idade. O primeiro condomínio espacial, o SiJO-001, foi instalado nos anos 30–XXI (a partir de 2010 se tornou usual especificar-se o século após se referir a determinada década). As informações que nos chegam são precárias, porém dizem que três ex-presidentes dos EUA no século XX vivem hoje numa dessas estações. Dos brasileiros famosos que se tem notícia, fala-se de dois ex-empresários das comunicações, ambos já senis em 2000, mas atualmente desfrutando seus cento e muitos anos nas estações orbitais, verdadeiras cidades suspensas no espaço sideral.




25 de dezembro de 2053.

É Natal. Por incrível que pareça, a música característica desta época ainda é Jingle Bells, o hino do Natal — sempre que entramos no mês de dezembro, o alto-falante do abrigo toca-o dia e noite. Basicamente não há justificativa para confraternizações de qualquer tipo. Contudo o Natal ainda é lembrado. Nas entradas dos abrigos subterrâneos, onde vive a maior parte dos litosféricos, são montados presépios. É uma iniciativa feminina, nos últimos tempos as mulheres sempre se encarregam de instalar as lapinhas (lembrei-me de minha infância, em minha terra chamavam presépio de lapinha). Existem atividades que só as mulheres exercem, montar presépio é uma delas. Nem antropólogos, nem sociólogos, nem psicólogos, ninguém consegue explicar as razões; mas o fato é que a mulher ocidental orientalizou-se (para usar este termo que foi um neologismo muito em moda nos anos 20–XXI), abandonou a postura feminista incrementada nos anos 70–XX, desistiu dos propósitos de emancipação profissional, de prover a subsistência em concorrência com os homens e reassumiu a condição de aparente submissão ao domínio masculino. Pela via contrária, ocorreu a ocidentalização das orientais. Pelo menos foi isso que vimos enquanto tínhamos acesso à Internet. Até o final da época das televisões via cabo e satélite, assistimos a muita manifestação feminista (no Oriente) e feminina (no Ocidente). Agora, sem rádio, televisão, jornal, revista ou Internet (só nos resta o Boletim Oficial, lido diariamente através dos alto-falantes), não sabemos mais a quanto andam as outras partes do mundo. Acredito que, hoje em dia, nenhum movimento de protesto ou reivindicação faz sentido em qualquer parte, pelo simples fato de não se ter a quem protestar ou reivindicar. As ZCOSGTA’s não passam de mero conceito geográfico, não têm governo próprio. Muita gente não sabe nem mesmo o que vem a ser governo. Há muito tempo não se usa o termo governar, mas sim, gerenciar. Os núcleos humanos são essas aglomerações sem identidade própria. Não se sabe ao certo o que são. Há muitos anos o termo comunidade caiu em desuso. A administração da OSGTA está restrita a pouquíssimas áreas. É o que chamam de gerenciamento mínimo, neoliberalismo (aqui está ele de volta, neomaquiado). Suas atuações mais marcantes estão restritas às áreas de Comunicação, por motivos óbvios, e Transporte — neste caso, especificamente porque temem migrações em massa. Migrar para onde? — estamos sempre a nos perguntar uns aos outros. Desconfiamos
que ainda possam existir na Crosta algumas áreas livres do chorume pluvial. Mas isso é apenas especulação.

13 de janeiro de 2054.

Ontem à noite ouvi uma conversa entre uns companheiros aqui do abrigo. São pessoas na faixa dos 40/45 anos, como a maioria dos habitantes dos abrigos subterrâneos. Esses companheiros sabem de muita coisa referente à época pré-chorume. Fgno, que parece ser o mais velho dos três, perguntou: “O que se imaginava que viesse depois do Armagedon?” Pxton respondeu: “O Livro Sagrado falava de condenação e salvação; inferno pra uns, paraíso pra outros”. Aí Rtno acrescentou: “As pessoas especulavam sobre como se daria o Armagedon. Muitos imaginavam o Dia do Juízo como um momento em que se desencadeariam aterrorizantes fenômenos; mas esperava-se um evento com dia e hora marcada pelo Criador”. Estou registrando este diálogo porque me lembrei de uma série de artigos escritos em 2019 por um sociólogo alemão, o qual defendia a tese de que o século XX corresponde ao período apocalíptico profetizado nos livros sagrados das diversas correntes religiosas. Para ele, o narcotráfico, que se disseminou pelo mundo até meados da segunda década do século XXI, seria a representação de um dos cavaleiros do apocalipse. (Em 2016 foi condenado e enviado para uma prisão submarina o último grande chefe do cartel das drogas na Amazônia. O SUJAZ, Sistema Unificado de Justiça Arbitrária para as Zcosgtas, atualmente prefere a aplicação do degredo interplanetário ao confinamento em prisões subaquáticas, ou à pena capital, por acreditar que tal castigo é mais exemplar que a própria morte.) Sua tese, até o presente aceita pela maior parte da população, é, ao meu ver, uma lucubração fantasiosa, sem nenhum respaldo científico. A bem da verdade, é preciso reconhecer que, tirante o nazi-fascismo dos anos 30 e dos 40–XX, os demais fatos históricos do século passado se transformam em romanescos acontecimentos, quando comparados a esta catastrófica situação dos dias atuais. Mesmo o narcotráfico, que chegou a dominar praticamente todo o mundo e ameaçou transformar a população terrestre numa ignava massa de dependentes químicos, está, na categorização mundial da malignidade, em posição inferior às organizações político-financeiras que controlam o mundo atual, lá dos palácios flutuantes, no Olimpódromo (nome dado à via espacial transitada pelas estações orbitais onde vivem as elites dominantes). As viagens à Crosta, para aqueles maquiavélicos manipuladores da Economia, são aventuras radicais: só desembarcam aqui e circulam entre nós fantasiados de astronautas. Na verdade, quem nasceu e criou-se no espaço, nos SiJO’s, ou mesmo quem vive por lá há muito tempo, não tem biorresistência para suportar a atmosfera insalubre aqui da Crosta.

17 de janeiro de 2054
(Costumo intervalar de períodos bem mais longos estes registros memoriais, porém um novo argumento me fez voltar aqui mais breve que de costume.)

Ontem me caiu nas mãos um velho exemplar de “O Século XX e o Apocalipse”, uma compilação de textos publicados entre 2015 e 2030, os quais teorizam sobre a hipótese de que o século passado corresponda ao período apocalíptico anunciado pelas profecias dos livros sagrados; conforme as conjecturas daquele sociólogo alemão, a quem me referi no registro de 13 de janeiro último. Os autores dessa obra são unânimes na opinião de que o Paraíso e o Inferno correspondem hoje à vida no Espaço e na Crosta, respectivamente. Assim, insistem em afirmar que os processos seletivos de condenações e absolvições, conforme as terrificantes revelações proféticas do livro Apocalipse, estejam explícitos nesta separação entre nós, os “excluídos” (habitantes da Crosta), e os “escolhidos” (habitantes dos SiJO’s). Mas garantem que ainda resta uma chance para os que aqui ficaram: salvarem-se através do processo de arrependimento e expiações e, finalmente, se submeterem a uma prova de incontestável fidelidade ao SUED — Sistema Universal de Educação e Disciplina, ou — como no original — Discipline&Education Universal System — DEUS.

05 de fevereiro de 2054.

Sei que até aqui estou dando a entender que discordo dessa suposta tese que faz do século XX a Era Apocalíptica, na qual teria ocorrido o catastrófico Armagedon, o grande conflito entre o Bem e o Mal. No entanto a minha opinião não é simplesmente discordante. Na verdade, quem vive (?) os dias de hoje e viveu pelo menos o último quarto do século XX sabe que, de todas as atividades criminosas, de todos os cânceres sociais conhecidos até o presente, de todas as formas de corrupção ou de qualquer outra degradação moral possível, enfim, dentre tudo aquilo que possa ser classificado como danoso ao ser humano, nada pode se comparar (menos ainda se equiparar) ao ganancioso domínio político do poder econômico, nem ao entreguismo dos vendilhões da Pátria, nem ao funesto poder bélico das arrogantes superpotências. Fatores que, interagindo, formam o maior complexo de geração das desgraças que hoje assolam o Planeta. Depois disso, só nos resta sentir Saudades do Apocalipse.